sexta-feira, 8 de maio de 2009

O que não dá pra evitar e não se pode escolher

Há certas coisas na vida que simplesmente acontecem e não precisam de muita explicação. O fato em si já é suficiente e vai além de qualquer rotulação. Seja Norte ou Sul, serra, sertão ou mar, há pontos que se interligam e realizam uma conexão invisível que permeia nossos vícios, virtudes e amores.

Sentir a música e através dela sentir-se é um dom e não um sentido inato. A engrenagem gira e nossos sentidos engendram o que quer que seja, onde quer que estejamos. Flui naturalmente, sem pressa, sem pressão. No escuro particular do nosso quarto, nos shows, no vídeo. É emoção que se renova sempre e ninguém consegue descrever a ponto de ser objetivo; simplesmente escorre pelos dedos e a gente fica sem saber o que dizer.

Os amigos que cultivamos e encontramos nas curvas da highway, os segundos que antecedem o início do show e a explosão de emoções, a espera no hotel, a espera pelo novo disco... Nada disso tem preço. Seja paixão antiga ou nova, Engenheiros do Hawaii é algo que levaríamos junto conosco caso o mundo fosse acabar amanhã e nosso destino post mortem fosse incerto.

Não importa os Gessinger trios, não importa os novos horizontes ou as poucas vogais. É música que consegue emocionar em seus três ou quatro minutos, que nos faz ir do riso ao choro e do grito ao sussurro sem pedir licença, sem explicar o porquê. Metáfora que fica no ar, versos indiretos e sublimes que fazem todo o sentido em nosso íntimo, mostrando em quantas páginas e cores a vida está mergulhada. São variações de um mesmo tema, músicas que dialogam e se completam, prato cheio para quem vibra em outras frequências.

Porém só a mudança é permanente. Os caminhos que seguem sempre se abrem para outros caminhos. É como um rio e seus afluentes. Então sentir saudades dos shows, dos amigos e momentos tornou-se algo que vem nos acompanhando nesses últimos meses. O que vem logo ali depois das poucas vogais ninguém sabe ao certo. Mas seja o que for, esteja onde estiver, Engenheiros do Hawaii é canção que não acabou.


quarta-feira, 11 de março de 2009

Solavancos no Mundo



As mudanças de conjuntura permeiam a história da humanidade há séculos, mudando os rumos da vida numa quebra e início de ciclos, assim como a cobra que engole o próprio rabo. Acredito que hoje assistimos definitivamente o início do século XXI há tempos falado, que só agora resolveu mostrar suas virtudes e pecados, envolto em mistérios que intrigam mais e mais os pobres mortais.

O obscurantismo inquisitorial que assola o mundo desde os tempos mais remotos perde espaço para a veiculação, nas mais diferentes mídias, de culturas diversas, rechaçando a autonomia das igrejas cristãs, sobretudo a Católica, e mostrando que a diferença é o que temos em comum. Questões envoltas em tabus seculares como homossexualismo, sexo, divórcio, aborto e livre-arbítrio ganham espaço e viram cerne de discussões rotineiramente, rumando para uma naturalização que cada vez mais entra em atrito com os ensinamentos da santa madre igreja. Quem imaginaria ir às ruas e defender a união entre pessoas do mesmo sexo quando o Santo Oficio tinha sua fogueira acesa, sedenta por carne humana?

Mas, lamentavelmente, ao lado das mudanças que sinalizam uma melhora para a humanidade, este século XXI nos revela fatos incontestáveis e desagradáveis. O colapso ambiental do qual todos tanto já falavam timidamente é comprovado através de estudos e a comunidade científica alerta para a possibilidade da destruição de 15 dos 24 ecossistemas do mundo, causando o surgimento de novas doenças, escassez de água, pesca e aparição de zonas mortas no litoral, caso medidas enérgicas não sejam tomadas para reverter este futuro apocalíptico que está mais próximo do que imaginamos. Muito se alardeia sobre o problema, porém nada é feito. A única crise que realmente preocupa as autoridades do mundo inteiro é a financeira, e não a ecológica.

E a crise financeira! Bastou a locomotiva do comércio internacional mostrar sinais de fraqueza e saturação para todo o restante da economia mundial apresentar sinais de fragilidade e insegurança. É o efeito dominó que está deixando as autoridades internacionais de cabelos em pé. O sistema vigente provou não conseguir acompanhar de perto as mudanças de conjuntura e agora agoniza na tentativa de sair do vermelho e se reinventar. Atitude típica de quem não se preocupa com o amanhã sempre pensando que ele acaba depois de amanhã. Milhões de trabalhadores perdem o emprego no mundo inteiro enquanto a caça ao new deal do século XXI segue desenfreada.

Contudo, uma das mudanças mais marcantes que figura atualmente como protagonista diante de todos esses fatos está a eleição de Barack Obama para presidente dos Estados Unidos da América. Isso não representa nenhuma revolução na política estadunidense, uma vez que Obama não está disposto a alterar substancialmente o rumo das coisas. Embora o fechamento da prisão de Guantánamo carregue um significado positivo, ele se elegeu apoiando a pena de morte, o direito constitucional de defesa dos proprietários de armas de fogo e não sinalizou mudanças na política externa norte-americana. É inegável que essa eleição tenha sido um dos acontecimentos de maior simbolismo nos últimos tempos no campo da política. Um negro foi eleito presidente na terra da Ku-Klux-Klan! Um país assumidamente racista que, ao que tudo indica, está mudando seus conceitos e pré-conceitos. Como afirmou o deputado federal José Genoíno, “(...) a eleição de Barack Obama já é um fato extraordinário não por aquilo que pode mudar, mas pelo que ‘já mudou’”.

Por aqui, nossa América Latina está num processo de afirmação de sua soberania em que a independência do continente tende a crescer. Há um processo de construção democrática e novos atores, sejam eles indígenas ou populares, desenvolvem seus modelos próprios de representação e democracia direta. Mas ainda não há muito o e que se comemorar. Na maioria dos casos, mudam os atores, porém o enredo continua o mesmo, com o toma-lá-da-cá persistindo sempre.

Analisar com precisão e destreza tais mudanças a ponto de afirmar que essas persistirão ou tratam-se apenas de uma crise, nuvem passageira, é ofício do tempo. As mudanças ocorrem com a circunstância atenuante de sua fugacidade, mostrando-se efêmeras ou não. Ver o novo, ater-se ao óbvio e arriscar um veredicto é demasiado complexo. Por ora, contento-me em dizer-lhes que deram uns solavancos no mundo e não sabemos ao certo o que tomou novos rumos.


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Um Outro Lado do Carnaval ou Todos os Carnavais

Por João Teófilo

De Norte a Sul deste país, eles brincam com ou sem máscaras, muitos deles sem saber o motivo de toda essa diversão. Num Maria-vai-com-as-outras, todos estão nas ruas, empolgados. Agarrados ao sexo de João ou Maria, virando manchete popular na quarta-feira de cinzas, embevecidos com o ninguém-é-de-ninguém, eles dançam e caem na gandaia até o raiar do sol, embriagados, saudosistas de um carnaval que sequer acabou.

Tudo é muito efêmero, hedonista e sem caprichos. As mulheres se pintam, mas os homens não conseguem distinguir quem é quem em bailes tão massificados e saturados de sexo, álcool e música alta. Os desejos estão à flor da pele na festa da permissividade e promiscuidade, em que tudo corre como num rio de delírios, com fantasias travestindo a dura realidade de uma rotina sem graça e monótona.

É como pôr para fora o que de mais pervertido está escondido no íntimo. É a oportunidade única de fugir às regras de uma sociedade puritana e reacionária; é o momento oportuno para esticar as rédeas e rumar para ambientes tentadores, proibidos para os caretas de plantão. Somente desta maneira eles saciam os instintos mais sacanas.

Maconha, cocaína, cerveja, cachaça, sexo, dança, dinheiro... Qual a diferença do carnaval real para o carnaval da televisão? Qual deles é mais carn-val? Qual deles acaba em penitências quando a quaresma se inicia? No fim, todos terminam num só carnaval, sem distinção entre mortos e feridos, gritos e gemidos. Para aqueles que foram além da conta, perdura o remorso, mas não um remorso qualquer: uma mistura de culpa e prazer, como na masturbação adolescente.

Tudo pode parecer meio nonsense para àqueles que têm o complexo de decência, mas não para àqueles que acreditam que devemos viver tudo o que há para se viver; afinal, não há tempo que volte. Na impossibilidade de agradar a gregos e troianos, o carnaval segue, arrebatando ou ceifando vidas em circunstâncias extremas. Extremo, talvez seja essa sua peculiaridade. Carnaval, a festa dos extremos.

Como para tudo que tem duas, três ou quatro faces, o carnaval é uma festa segregada, com seus matizes moderados, liberais e reacionários. Cada um à sua maneira, com ou sem lança-perfume, a única regra é diversão à beça. Assim, feitas as escolhas, eles seguem em direção ao que mais lhe convém.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Espectro do Sol ou a Janela de Vidro da Alma

Por João Teófilo


Ele permaneceu em silêncio ouvindo atentamente cada palavra como se aquilo fosse a última coisa a ser feita em sua vida. No final, pairava no ar a dúvida sobre a extemporaneidade dos homens que dançam ao som do silêncio e têm retido no íntimo a necessidade de buscar nova vida em horizontes desconhecidos. Incrível era descobrir que, de forma sobre-humana, duas almas estivessem ligadas misteriosamente, numa congruência bela, tornando os mundos menores, menos distantes.

A vontade de querer parar de nascer sempre falou mais alto sem nunca ter explicado o porquê. E a princípio sempre pareceu ser a única opção, inevitável como o pôr-do-sol de todos os dias. Por mais que ele falasse sobre os sentidos que se poderiam dar a vida e tudo o que a ela está intrinsecamente ligado, por mais que ele tentasse de todas as maneiras ensinar o sentido da felicidade, escondido num sorriso, eu insistia na necessidade quase que inerte de querer sair, voar sem saber, apesar das promessas de andar juntos beirando o destino, o inevitável, sempre diante do mar.

Talvez a congruência venha do sol, do qual somos espectros perdidos em meio a milhares de brilhos, bilhões de sóis, que não são absorvidos, não refletem, que ninguém vê. Extremos no mundo de cada um vamos seguindo, buscando a canção mais adequada para celebrar nosso nascimento póstumo. Enquanto um quer vir à tona, o outro procura na mais profunda escuridão enterrar-se e levar consigo os papéis amassados daquilo que um dia foi um pouco de vida, olhos da tua vida.

Mas não há como se esquecer daquele que descobriu a janela de vidro da alma. Sagaz, devagar, sutil. E hoje sem a janela não vivo, temendo que ele a esqueça, não a veja, e venha a nascer junto com os demais, tardiamente, longe dos espectros do sol que ele mesmo descobriu e um dia me ensinou. Temendo que o mundo real o absorva para longe dos hiperbóreos e o transforme em humano, longe do animal. Só ele consegue enxergar além do vidro da janela.

Como a mais bela melodia engendrada; como Sinclair e Demian, eles buscam um sentido escondido em algum lugar, à porta do Teatro Mágico com entrada só para os loucos, só para os raros. Ele continua escutando. Para e repara, diante da porta, mas com o olhar preso à janela. Só ele enxerga para além e eu vou ao fundo do mundo e trago de lá o que o óbvio não consegue captar. O além do óbvio sempre corre muito além da escuridão e ele precisa saber. Pode parecer confuso, mas é o que importa. Estar confuso significa está prestes a entrar para o Teatro Mágico. Ele despede-se, promete voltar e pede para que eu fique bem como se isso fosse fácil. Breve de novo estaremos diante da porta e eu anseio por isso como se fosse a única coisa que bastasse na vida. Pode não ser a única coisa que importe, mas me faz muito bem. Quem dera eu tivesse um túnel do tempo! Quem dera eu soubesse brincar de ser Deus!

O que nos faz acreditar que cedo ou tarde chega o dia? Deve ser a luz no fim do túnel que me é inata. E quando a luz no fim túnel na realidade foi a luz do trem, ele pediu que eu acreditasse num amanhã colorido, acreditasse que a vida vale a pena. Absorto em pensamentos, eu me pergunto como tudo começou. Aliás, me pergunto se poderia ser diferente?! Não, estava escrito há tempos que era para ser desse jeito; premeditado como os crimes perfeitos. Então eu vou, relembrando suas palavras: “mesmo que a loucura me devore e que as máscaras entrem em cena, relembro o caminho que fiz para achar quem muitas vezes procurei em toda cidade.”

Sobral, janeiro de 2009.


quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Qual a verdade sobre o tempo?

Por João Teófilo

Por mais que o último dia de dezembro seja sempre igual ao primeiro de janeiro, fantasiamos uma nova vida a partir dessa data, projetando futuros, mas revendo os planos e balanceando o que fez parte da nossa vida nestes 365 dias. É como chegar ao final de um filme e recapitular o drama na tentativa de melhor compreender a história.

Para alguns, pode parecer estúpido; para outros, o momento de olhar a vida e conhecer-se melhor, olhar mais para dentro e descobrir um sentido vazio, escondido em algum lugar. São nos momentos sutis, como caminhar na praia ao fim da tarde, que paramos para ter pensamentos que não conseguimos ter na correria do dia-a-dia. Ao invés de preocupar-se com o trânsito, relatório de trabalho ou contas a pagar, contemplamos o amanhã e a beleza do sol, ouvimos uma música e respiramos com satisfação, e não estresse.

Por mais que seja simplesmente a mudança de um dia para outro, de um mês para outro, de um ano para outro, é o momento, singular momento, que vemos uma vida ficando para trás e outra surgindo. É o momento que questionamos se o tempo é ou não uma ilusão, se vale ou não a pena preocupar-se com ele. É o momento em que o futuro, que sempre nos parece remoto, fica mais próximo.

Então, vamos esperar que o sol já vem! Vamos viver um dia de cada vez e preocupar-nos com coisas que de fato importam, aprendendo a conhecer o que nos torna felizes. A vida é feita de sutilezas, e por ser sutil nem sempre a vemos como ela é. Se o momento é de renovação, de acreditar no novo, vamos não só acreditar, mas construí-lo, ao sabor do acaso, apesar dos pesares. De coração, um 2009 com alegria constante!

[Pato Fu - A Verdade Sobre o Tempo]

http://www.youtube.com/watch?v=GW2xPKP8h3g