quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Espectro do Sol ou a Janela de Vidro da Alma

Por João Teófilo


Ele permaneceu em silêncio ouvindo atentamente cada palavra como se aquilo fosse a última coisa a ser feita em sua vida. No final, pairava no ar a dúvida sobre a extemporaneidade dos homens que dançam ao som do silêncio e têm retido no íntimo a necessidade de buscar nova vida em horizontes desconhecidos. Incrível era descobrir que, de forma sobre-humana, duas almas estivessem ligadas misteriosamente, numa congruência bela, tornando os mundos menores, menos distantes.

A vontade de querer parar de nascer sempre falou mais alto sem nunca ter explicado o porquê. E a princípio sempre pareceu ser a única opção, inevitável como o pôr-do-sol de todos os dias. Por mais que ele falasse sobre os sentidos que se poderiam dar a vida e tudo o que a ela está intrinsecamente ligado, por mais que ele tentasse de todas as maneiras ensinar o sentido da felicidade, escondido num sorriso, eu insistia na necessidade quase que inerte de querer sair, voar sem saber, apesar das promessas de andar juntos beirando o destino, o inevitável, sempre diante do mar.

Talvez a congruência venha do sol, do qual somos espectros perdidos em meio a milhares de brilhos, bilhões de sóis, que não são absorvidos, não refletem, que ninguém vê. Extremos no mundo de cada um vamos seguindo, buscando a canção mais adequada para celebrar nosso nascimento póstumo. Enquanto um quer vir à tona, o outro procura na mais profunda escuridão enterrar-se e levar consigo os papéis amassados daquilo que um dia foi um pouco de vida, olhos da tua vida.

Mas não há como se esquecer daquele que descobriu a janela de vidro da alma. Sagaz, devagar, sutil. E hoje sem a janela não vivo, temendo que ele a esqueça, não a veja, e venha a nascer junto com os demais, tardiamente, longe dos espectros do sol que ele mesmo descobriu e um dia me ensinou. Temendo que o mundo real o absorva para longe dos hiperbóreos e o transforme em humano, longe do animal. Só ele consegue enxergar além do vidro da janela.

Como a mais bela melodia engendrada; como Sinclair e Demian, eles buscam um sentido escondido em algum lugar, à porta do Teatro Mágico com entrada só para os loucos, só para os raros. Ele continua escutando. Para e repara, diante da porta, mas com o olhar preso à janela. Só ele enxerga para além e eu vou ao fundo do mundo e trago de lá o que o óbvio não consegue captar. O além do óbvio sempre corre muito além da escuridão e ele precisa saber. Pode parecer confuso, mas é o que importa. Estar confuso significa está prestes a entrar para o Teatro Mágico. Ele despede-se, promete voltar e pede para que eu fique bem como se isso fosse fácil. Breve de novo estaremos diante da porta e eu anseio por isso como se fosse a única coisa que bastasse na vida. Pode não ser a única coisa que importe, mas me faz muito bem. Quem dera eu tivesse um túnel do tempo! Quem dera eu soubesse brincar de ser Deus!

O que nos faz acreditar que cedo ou tarde chega o dia? Deve ser a luz no fim do túnel que me é inata. E quando a luz no fim túnel na realidade foi a luz do trem, ele pediu que eu acreditasse num amanhã colorido, acreditasse que a vida vale a pena. Absorto em pensamentos, eu me pergunto como tudo começou. Aliás, me pergunto se poderia ser diferente?! Não, estava escrito há tempos que era para ser desse jeito; premeditado como os crimes perfeitos. Então eu vou, relembrando suas palavras: “mesmo que a loucura me devore e que as máscaras entrem em cena, relembro o caminho que fiz para achar quem muitas vezes procurei em toda cidade.”

Sobral, janeiro de 2009.